Todo mundo sabe que bruxaria, mandinga, despacho, sessão de descarrego, velas e rezar para um deus que não-é-deus-de-verdade é coisa do Diabo. Pergunte a qualquer crente fanático. Pelo visto, trabalhos escolares devem entrar neste rol, como foi o caso de um colégio municipal em Campinas, onde inteligentíssimos pais acham que aquilo é Hogwarts e a bruxaria come solta. Tudo por causa de quê? Por causa daquele maldito Harry Potter e seus poderes demoníacos, visando libertar Lúcifer para a Batalha do Armagedon.
Lutando contra a ignorância, em prol dos sagrados laços cristãos da sanidade mental, declaro que esta é sua SEXTA INSANA!
Tudo aconteceu em Campinas, a Pelotas de São Paulo. Se tem algo que acaba em tragédia é quando um professor resolve ter ideias para despertar o interesse dos alunos.De acordo com a notícia trazida pelo Abaddon (que provavelmente leciona neste colégio), um professor de português teve a “brilhante” ideia de usar a mítica mística que envolve as histórias do Harry Potter, o bruxinho metrossexual que contracenou nu com um cavalo (é sério!), e resolveu fazer um trabalho de macumba contextualizado de leitura e interpretação de alguns textos que mencionam feitiços, poções e coisas do gênero, com direito a assistir ao filme do Haroldo Pote e fazer um trabalho extra-classe sobre isso.
Lindo no papel, mas o pobre professor não contava com a astúcia ignorância de alguns pais retardados, que acharam que o professor estava levando seus alunos do 6º ano do Fundamental para o Lado Negro Afro-brasileiro, e sem direito a cotas. Isso porque ele apresentou o trecho a seguir:
Eles foram atraídos pelo canto de Circe, que os recebeu gentilmente e ofereceu comida e bebida. No entanto, Circe havia misturado uma poção mágica na comida, e os homens se transformaram em porcos.
O objetivo era tratar das poções para depois abordar contos fantasmagóricos e de assombração, coisa que qualquer moleque que não foi criado com a avó que usa anágua de suspensórios adora. O jornaleiro, digo, jornalista que escreveu a matéria disse que este trecho está presente no texto “Transformando Homens em Porcos”, retirado da revista Monstromania, Editora Girassol. Pena que o jornaleiro não se ligou (talvez por não saber) que isto pertence… à Odisseia, de Homero, o livro que relata a volta de Odisseu (que os romanos chamavam de Ulisses) e seus marinheiros da guerra de Troia, que foi narrada na Ilíada. Odisseu e seus machos sarados demoram cerca de 10 ANOS para voltar pra casa e, no final, só Odisseu é que chegou mesmo em sua casa, na Ilha de Ítaca, a fim de reencontrar sua estúpida devotada esposa Penélope, que ficou costurando lá, esperando pelo maridão, enquanto este traçou sílfide, ninfa, bruxa e tudo que foi rabo de saia que apareceu pela frente durante a viagem.
Como os pais dos alunos são desinformados e não faziam a menor ideia disso, reclamaram que o professor estava fazendo seus filhos se voltarem para a bruxaria e outras besteiras. Um dos pais até mesmo ameaçou tirar o filho daquela escola, pois isso não é coisa que Jesus ensinasse. Jesus não fazia poção, quando muito embriagava o pessoal, para que seus 12 asseclas “limpassem” o pessoal que estava para lá de Bagdad. A alegação é que isso feria a crença religiosa da família, mesmo porque leitura não é algo muito apreciado pelas Ovelhinhas do Senhor.
Entretanto, devo mostrar-me surpreso com a atitude da Orientadora Pedagógica. Ela teve uma amnésia temporária, esqueceu quem era e resolveu ficar do lado do professor, dizendo que “é muito perigoso é que a gente pode acabar incorrendo no erro de enxugar do currículo todas as manifestações culturais. Por isso mesmo, a escola é laica para informar sobre a diversidade das manifestações religiosas. Se a criança vai acreditar ou se aprofundar, é um trabalho que compete à família”.
Na cartilha das Ovelhinhas, laicismo significa anticristianismo e deve ser banido, pois onde já se viu você ter liberdade de crença? E estudar manifestações culturais que não aquela que seu pastor diz que sim? Isso é blasfêmia! Tudo bem que o trabalho não envolve outras religiões, mas vai que os pupilos passem a encarar a Bíblia, com seus sátiros, dragões, unicórnios, coacktrices, monstros marinhos e burros falantes como sendo algo parecido com Harry Potter, que tem unicórnios, serpentes falantes, grifos etc? Vai que nas histórias aparecesse o Dumblemore curando feridas e fazendo a comida aparecer do nada? Não, isso desvirtuaria tudo o que se pode chamar de lógica e não podemos deixar nossas crianças terem acesso a gente barbuda fazendo mágica.
As modernas ficções fantásticas são belas e merecem seu lugar. Seja Harry Potter, Senhor dos Anéis, John Constantine e o Crepúsculo… ok, vamos excluir o Crepúsculo disso. Privar as crianças de trabalhar elementos literários só porque isso deixa o pobre fanático ofendidinho (e eles se ofendem com qualquer coisa) não é motivo para alarme… ou é, já que a fé frágil dessas criaturas lhes dá medo.
Se lemos muito, muito esquecemos, mas não tudo. É preciso que se leia muito e se esqueça de alguma coisa. O que fica depois que se esqueceu algo é o que chamamos de “Cultura”. Quando se lê um livro e não se sabe nem o que o livro trás, você, caro alienado, não leu nada na realidade e não é nem digno de pena; mas de ostracismo. Nem que seja numa cela fétida em Azkaban.
Um comentário:
Sou evangélica, já li os livros do Harry Potter, vi os filmes e não vejo nada demais...existe ocultismo sim, mas a criança não vê por esse lado!
Bjs e paz!
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